quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Fatalidade

Naquela manhã tudo acontecia normalmente. A velha senhora regava suas estimadas plantas, e eu, uma criança ainda, procurava alguma brincadeira que preenchesse minha monótona vida infantil...

Sob a luz do sol os seres humanos buscam a vida.

A despeito de quem somos nós, ou o que queremos e faremos, o planeta gira, e em fatos fora de nosso controle, tudo pode acontecer. Pois que nesse dia foi assim.

Em frente a minha casa um carro azul que eu nunca tinha visto. Um homem trajando um casaco também azul conversou com minha mãe, como que alguém que aciona algo, através de palavras minha mãe foi induzida a chorar.
Naquele dia as plantas da velha senhora da casa ao lado eram tristes, e contemplariam
por dias a minha tristeza, naquele dia meu pai morreu.

Com o passar dos dias aumentava a tristeza de minha mãe, em mim, apenas a incompreensão.
Deus não existe?

Nunca me dei conta de como algo pode ser tirado de nós, e de como a vida continua
de qualquer forma. Um emprego, um casamento, uma amizade, a juventude e o tempo...

Tudo em vão?

Eu nunca chorei pela morte de meu pai, era um estranho pra mim, mas sentia pena de
minha mãe e sua dor.

Com tudo, vieram outros dias. E com os olhos cheios de remela, no frescor suave duma
manhã de verão, vi numa maca a velha senhora, sem vida, com a boca sinistramente aberta...

Não havia ninguém pra chorar. E como em tudo que é fatal eu sabia: as plantas também vão morrer.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

sonhos do passado


Perdidos em meus dias do passado estão meus sonhos
nas minhas frustrações o gosto amargo da derrota
do amor que não se realizou

Em dias que não voltam lembranças cinzentas
a vida não perdoa os covardes

E nesse tempo, morada de minhas desilusões estão inúmeros fantasmas
que em noites de insonia me atormentam

Jogado de joelhos na terra, escorrem pelas minhas mãos mais uma chance
Assim são os dias...eterna esperança

Com as mãos para o céu aclamando por Deus, tenho certeza:
Nunca mais exitar!

Sem arrependimentos, até o fim, pois que aprendemos
que não existem limites para a alma do homem

domingo, 11 de julho de 2010

introspecção


É sobre tudo nos momentos de total solidão e silêncio que a existência se mostra em sua totalidade.
Quando nossa atenção não esta distraída na ilusão do dia a dia, nas tarefas da sobrevivencia cotidiana, então tudo é a extenção e percepeção de nossa mente.

É na escuridão e no recolhimento de meu quarto que o mundo existe em mim como uma harmonia de cristal, algo insustentavel e limpo, frágil e valioso.

É nesses momentos que quase posso sentir a presença de Deus e essa introspecção é minha religião.
Isso é religar
Voltar para o centro da vida, emanando energia com o todo.

E saibam vocês que fazer isso me da mais que força para continuar me da inspiração criativa me trás a certeza que nossos átomos estão combinados e agindo por algum motivo.
Algum segredo.
Algo a se revelar.
E enquanto não há respostas, continuo a perseguir a plenitude da consciência.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Mar revolto da alma


Hoje trago mais metáforas pra vocês.
Como alguém que lança uma garrafa ao mar, na esperança que o texto contido nela seja lido por alguém.
Esforço patético de expressão e sentimento.
Sim! Esse mar revolto e agitado que há em mim. Uma tempestade em oceanos distantes e de águas mais que profundas: insondáveis.

Eu sou uma tempestade de inverno em alto mar.
E na segurança do seu lar você me desconhece, me ignora.
Faço lágrimas que quando chovem se misturam a água também salgada do mar.
E esse mar é a vida e a morte.

Quando estou sozinho e meus olhos embotados enxergam o horizonte Minha revolta se resguarda.
Assim são os homens: dão um tempo para pensar.

E saibam vocês que existem muitos motivos para se escrever, se expor nesse blog.
E um deles é esse mar revolto em uma tempestade.
A tempestade no inverno de minha alma.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Estrelas


Num gráfico de computador pude ver o magma de um vulcão se encontrando com a água do mar, e nesse gráfico podia-se ver perfeitamente os micro organismos: estavam dispostos em camadas, cada qual vivendo em condições de calor apropriados a sua natureza.
Diziam também que provavelmente foi em condições semelhantes que a vida se criou na terra.

E se eles estiverem certos?
E a vida não for mais nada do que isso, a vil matéria. A lei do caos num principio de combinações químicas complexas e infinitas.
Nossos átomos vibrando estúpida mente em suas eletrosferas malucas.

Se a vida se trata apenas de combinações quimicas, de matéria contra metéria, então sentimentos e toda a poesia não valem nada, são ilusão e perda de tempo.

E eu? quem sou?
sou uma grande coencidencia, ou me faço em busca de um destino?

Me lanço no universo nessa incerteza, essas estrelas distantes talvez tenham a resposta, pois elas sim, tem a luz imemorial, que viaja pelo cosmos.
Assim como elas, nossa luz continuara a brilhar através do espaço sideral, mesmo após nosso fim nesse planeta...

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Uma noite de outono


Na chuva, em uma noite estúpida de outono, me vi olhando pela janela do ônibus, refletido em uma vidraça mais uma vez meus olhos perdidos em pensamentos...

Em mim, o sonho de não ser nunca mais escravo, e em palpitações meu coração se precipitava para o futuro, em algum lugar onde a solidão e o frio não possam me alcançar.

E um medo me corre pela espinha: que esse lugar se chame "morte".

Em noites assim, quando não estamos nem no natal nem em nada, eu quase posso ver a melancolia e o tédio, são duas criaturas vestidas de cinza, e tem uma face de resignação e tristeza.
E as vezes quando olho para o céu, e o giro distante das estrelas me trás uma leve vertigem, me esqueço da chuva, faço uma grande nuvem de fumaça com meu cigarro, e penso mais um pouco...

Como seria bom destruir noites assim, num lance apenas, desorganizar tudo, e como uma criança rir satisfeito da peraltice.

Em uma noite de outono...

sábado, 24 de abril de 2010

Continuar no caminho

Quando olho pro horizonte me vejo indo embora.
O que podemos fazer se não dar as costas e partir quando tudo nos diz não?

Se eu pudesse mudar o mundo teria começado por mim, se eu pudesse realizar qualquer sonho nunca mais despertaria do nosso sonho. Assim vivemos em busca da vida, e nossas decepções por incrível que pareça nos deixam mais fortes, e isso é uma lição que dói no coração.

As pessoas que foram embora, os mortos que atormentam em noites de tempestade, a mancha negra na camiseta branca.
quando estou com o gosto amargo da derrota na boca, ainda sim tenho um sorriso de escárnio, nada me resta se não ser fiel a mim mesmo.
Meus ideais, meu amor, meu Deus e minha vida inteira na expressão máxima dos sentimentos...
"o mundo é a concepção que fazemos dele."

Então apenas pensar é criar o mundo inteiro, mãos a obra!

terça-feira, 13 de abril de 2010

Obrigação e dever

Pela manhã vejo os trabalhadores indo para seu destino com faces de resignação.

A força mecânica da necessidade.

Como é enfadonho e triste se fazer algo por obrigação.
Como disse Fernando Pessoa:
"Que bom ter um dever pra cumprir e não fazer, que bom ter um livro e não ler...felizes são as crianças..."
Então me imagino longe de tudo isso, ganhando a estrada, vivendo um dia após o outro.
Ah que bom seria.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Desespero

Na escuridão da mata virgem, onde exu come degetos
E no lodo podre, morada do monstro de poluição
Na casa mal assombrada, de histórias antigas e assustadoras
Nesses lugares eu, o poeta taciturno me deitei e refleti sobre a vida e a morte

Em cemitérios de mortos esquecidos as lapides foram meu leito
E nos becos escuros onde viciados desesperam e matam, um passeio noturno

A maldição da cidade grande, o frio da calçada e das pessoas
Os versos não curam feridas nem salvam o dia
Mas vertem a dor, como num ato de desespero e agonia
De alguém que da vida só faz esperar...

Olhando o semblante de alguém que vem, sinto pena
A ilusão de que a matéria toca e existe como algo real
Pessoas e animais, lutando por água e comida
"nem só de pão viverá o homem"

Deus e o diabo dançando uma eterna valsa
Num salão vazio
Esse é o grito e o pranto que ninguém viu nem se importou
Quem nos viu chorar sozinhos no quarto naquela noite de inverno?
Quantas vezes meus punhos cerrados e o grito calado
Nossa revolta e destruição serão abençoadas
Pois nesse caos e fim
um novo recomeço...

domingo, 4 de abril de 2010

O rio do tempo


Naquela época os homens ainda eram nomâdes, e sobreviver era viver.
O céu carregado trazia a beleza melancólica dos dias cinzas...
E aquelas planícies, onde um dia seria a Macedonia, lá se encontraram pela primeira vez.
Por um momento Kail a olhou nos olhos, e achou estranho não estar desejando joga-lá no chão e possuí la ali mesmo .Queria apenas olhar.
Não falaram.

Na segunda vez trouxe frutas e disse que era um grande caçador da tribo que vivia além das margens do rio.
Nesse tempo a linguagem ainda era primitiva, e nem sempre era fácil se expressar, apesar de tudo ela entendeu, e sorriu.

Pela terceira vez teve certeza que muitas outras ainda viriam, então se amaram.
Kail e Sarcha.

"Encontrar Sarcha é como me encontrar, hoje meu coração se alegra e sente que tudo é como estar em casa novamente depois de uma grande viajem."
com essas palavras simples mas sinceras, celebraram sua união. Os deuses estavam
felizes, as duas tribos felizes, a primavera havia chegado.
Então veio a guerra...
Nos primórdios da humanidade o instinto animal e a barbárie eram virtudes de um guerreiro.
Quando a aldeia foi invadida, os inimigos vindos de além dos morros altos, chamados persas, foram impiedosos, mataram todos homens e velhos, saquearam e estruparam,
beberam e comeram durante dias, depois foram embora.Quando Kail voltou do deserto,
onde se escondera para não ser morto, encontrou sarcha, quase morta.
trocaram as ultimas palavras numa das tantas tardes cinzas da velha Europa:

"Meu amor, hoje saio da vida mas permaneço em teu coração, que eu seja uma lembrança boa como uma brisa que as vezes nos refresca e vai embora."

As lágrimas verteram ao natural, Kail sentiu ódio dos deuses, sentiu ódio de si mesmo, amaldiçoou o céu cinzento e a terra manchada com o sangue do seu amor.
Por fim se lançou em disparada em busca dos persas.Decidido a morrer, decidido
a lutar.
Amorte veio através de uma espada rápida e traiçoeira, quando sentiu o gosto de sangue na garganta e a vertigem na cabeça, simplesmente lembrou de Sarcha.
Sim estariam juntos de novo.

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A vida não acaba com a morte...
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Para se chegar a cidade de Kannauj era necessário atravessar o rio Ganges.
No fundo do seu leito, o Ganges guardava os corpos sem vida de aventureiros, que no passado assim como Kail haviam tentado a sorte num dia de tempo ruim.
A escuridão era tudo em sua volta, o vento se manifestava em toda sua fúria.
Por três vezes o pequeno barco quase virou. Mas não.
Kail olhou para o vácuo negro do céu, na profundidade de toda aquela noite de trevas agradeceu a Deus.
Sabia que por trás daquele céu havia outro céu, onde o sol iluminava e aquecia.

"Deus, energia que move o universo, mais uma vez as adversidades e o acaso tentam me destruir, mas como tudo é a manifestação do teu poder, não deve o mal prevalecer. Manifesta o teu poder atráves da minha alma."

Quando Kail chegou ao outro lado estava exausto, seu pequeno barco semi destruído.
Deitou-se no chão olhando novamente para o céu.
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Sarcha tomava seu café e mastigava o pão mecânicamente. Olhava para a televisão,mas na verdade seu olhos estavam imersos no vazio, olhavam para dentro, sentia uma dormência nos dias.
"Será que a vida será sempre assim?"
Lá fora a tempestade não dava trégua, por um instante pensou em não ir a escola.
Mas afastou a ideia, já era o terceiro ano consecutivo que estava na mesma.
Sabia que tinha que fazer, mas não gostava .
Já a caminho do ponto do ónibus viu na rua um barquinho de papel sendo levado pela água em direção ao bueiro. Sentiu algo estranho ao olhar aquela aparente cena sem importância.
Um relâmpago sonoro e luminoso rasgou o céu bem a sua frente.

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Aquele relâmpago foi um sinal pensou Kail.
O destino mais uma vez se fizera atráves da vontade, e não ao acaso.
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Muitos rios ainda vão passar pelas vidas de Kail e Sarcha, a água levando
tudo, renovando e enchendo de vida. E com a certeza de que esse rio
pode apenas levar ao lugar onde moram os sonhos, devemos continuar
e sermos um pouco como eles.

domingo, 21 de março de 2010

Reflexão do errante solitário

Todos se divertiam bebendo cervejas e jogando conversa fora, os bares estavam lotados, a cidade tinha um clima ameno, era um final de tarde morno. Já eu, tinha mil pensamentos conflitantes em minha mente, eu e minhas metafisicas absurdas, e talvez irrelevantes. Foi então que me veio a revolta, revolta comigo mesmo.
Me ensinaram que devemos dissipar a raiva o mais rápido possível, assim superando nosso carma e nos elevando.
Porém, hoje não.
Que criatura sou eu afinal de contas?


O abismo que me separa da alma do mundo as vezes me entristece de tal maneira que não sei bem o que é ser feliz mesmo.
Sempre me vejo andando sozinho no horizonte, com o sol ou a lua. E estou a caminho não sei da onde, mas sei que é meu caminho. Essa é pra mim uma felicidade muito
estranha, como algo triste , sem entusiasmos e exaltações, algo bem a moda leitor sinistro.

Então me vem na cabeça as seguintes cenas:
-Alguém sentado sozinho no canto do bar fumando e bebendo, lendo e fazendo anotações.
-Uma folha de caderno rolando pela rua, nela tem um poema que logo será lido e jogado fora novamente.
-Um gato todo preto em cima do muro.
-Uma velha figueira no alto do morro.
-Uma criança conversando com seu amigo imaginário.
-A professora que não tem filhos.
-A televisão fora do ar.
-O mar a noite.
-A casa vazia ao entardecer.

-Eu sentado no banco da praça miseravelmente só

terça-feira, 16 de março de 2010

Filosofia do nada 2...

Quando soltamos a fera que existe em nós, o mundo todo se transforma em nossa selva.
Houve um tempo em que caminhávamos em direção a um destino traçado por outros, tempo que a segurança desses planos simplesmente parecia ser tudo.
Agora, mesmo em incertezas, existe algo de nós mesmos em cada segundo que vivemos, pois que tomamos nosso destino. Se vai dar certo ou não é outro assunto.
Essas foram algumas linhas da literatura que nasceu desse pensamento.

terça-feira, 2 de março de 2010

Papo viajante...


Em algum lugar na memória oculta do pensamento, onde tempo e espaço se misturam
num mistério fora da compreensão humana, nesse lugar está guardado o segredo mais precioso da existência: somos energia pura.

No planeta terra toda evolução do homem se deu através da compreensão, controle e sabedoria com que empregaram no uso das energias da natureza.

Do calor do fogo a divisão de átomos.

Controlar a própria energia consiste no que há de mais refinado na arte da vida.
Observando o movimentos das coisas com vida tive essa visão:nós, energia pura agindo e interagindo num universo de troca, perda e ganho de mais energia.
Não consigo pensar em outra palavra se não:expansão.

sábado, 23 de janeiro de 2010

20.000 milhas


Sem querer ouve um estrondo em minha mente
E numa viagem astral por um momento fui transportado para fora de meu corpo
Então por fora de meu mundinho pude ver tudo claro

Depois de viajar 20.000 milhas deixando o homem que um dia eu fui
Compreendi a vida e sua simbiose caótica e crua...

Pensando nas pessoas que deixei pra trás amei cada momento do meu passado
E senti o futuro, perplexo numa existência atemporal

Quem sou, se não o homem?
O mesmo homem histórico em sua passagem pela terra

Eu, andando pelas ruas de Viena, ou sentado em uma praça em Moscou
Senti o frio do inverno e a dureza da guerra
E com os ossos e a carne, toda a magnitude da dor e do desespero.
Respirei os ares da mudança, me afogando no mar de gente da metrópole...

Por um instante, em uma entrega patética, observei-me
Incrédulo e curvado perante a existência cósmica

Sem querer ouve um estrondo em minha mente
E minha vida e a tua não eram tristes
Nesse breve instante eu fui a consciência dos homens

E agora mais 20.000 milhas são meu caminho...

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Reflexão anarquista


Em campos abertos as planícies verdes se estendem, e não terminam com a limitação de nossa visão, continuam em nossas mentes em sonhos inefáveis de um futuro que nos aguarda.
Assim eu pensava naquela tarde...
Como pode um homem ser pleno se não através da libertação da mente?
Que prisão, que muros podem haver quando nossa concepção do mundo se torna nossa, e não um esboço da mente de algum pregador da verdade?

Que Deus pode haver no céu, quando o milagre se projeta de dentro pra fora?

"Agora que somos livres e podemos voar o céu já não nos pertence."

Damos asas a imaginação, esperança ao coração.
Assim se aproxima a era sonhada por antigos e novos filósofos:
A era do homem e sua superação.
A libertação das amarras e grilhões do pensar, a queda de antigas crenças, a derrubada de antigos mitos.
O jovem anarquista é um sonhador, e a quimera desse sonho não é para todos, apenas para os que buscam a plenitude de si mesmos.

domingo, 3 de janeiro de 2010

O velho capitão


A meia hora de caminhada do vilarejo de Santa Helena, ficava o antigo cemitério.
Já fora de uso a duas gerações, guardava em seu fúnebre leito os restos dos que um dia foram os fundadores do vilarejo.
Suas lápides encardidas, vasos e cruzes, tudo ali lembrava abandono e solidão.
Foi nesse lugar que encontrei o fantasma do capitão pela primeira vez.

Naquele tempo a energia da juventude e sua inconsequecia tinham me levado a caminhos tortuosos. Procurei o antigo cemitério numa de minhas fugas das surras de meu pai.
Nesse dia o sol ardia furioso, e uma brisa morna soprava levemente. Encostado a um velho túmulo eu comia laranjas e pensava em como voltar pra casa. Então o velho capitão apareceu...

Trajava uma velha farda azul e botas pretas. Usava barba e chapéu. Tinha uma voz forte e grave. Suas primeiras palavras foram:

_O que fazes tão longe de casa guri?Onde estão teus pais?
_Eu...Eu estou comendo laranjas...
_Não sabes que é perigoso uma criança por ai sozinha?
_Eu não tenho medo.
_Pois deveria, a maldade humana é imprevisivel.

E assim o velho foi embora. Incrível que logo na primeira vez já me ocorreu a ideia de que o capitão era uma alma penada.
Na outra semana voltei, mas dessa vez, o que me levou foi apenas a curiosidade. Então pela segunda vez vi o capitão, que desta vez estava ajoelhado em frente a uma grande cruz que ficava no centro do cemitério. Não chamei sua atenção. fiquei apenas observando tudo. Como era triste aquela cena. Dali podia sentir toda frieza da solidão, e com o vento minuano veio o inevitável: o medo da morte.
Talvez o velho capitão nem soubesse que estava morto, talvez estivesse ainda em sua guerra, em sua revolução. Fiquei olhando para a cruz, então percebi que mais uma vez o fantasma tinha sumido.

Quando o inverno chegou e cobria toda manhã os campos de branco, eu já tinha me esquecido do cemitério. Então achei um velho jornal, e lá estava a foto do capitão:
"Aos heróis da revolução de 30..."
O velho fantasma era um herói!
E nesse mesmo dia voltei ao cemitério, e quando o capitão se aproximou mostrei o jornal e disse:
_Capitão, a guerra acabou.
_Eu já sabia meu filho, apenas não podia deixar toda minha terra pra trás. Vê tudo isso aqui? É meu, meu!
Senti pena. Mesmo sendo uma criança compreendi a lição que a vida me ensinava.
Compreendi como o apego iludia o fantasma.
Fui embora e prometi a mim mesmo nunca mais voltar.
E até hoje imagino o velho capitão solitário andando por suas terras.